Célia Chaves

Psicóloga clínica, psicanalista em formação, jornalista, palestrante e terapeuta de casal. Atendimentos presenciais, on-line e domiciliar
Celia Chaves

O último capítulo de um casamento que deu certo​

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No auge da ditadura militar, em 1976, a censura proibiu a novela “Despedida de Casado”, a poucos dias da estreia, na TV Globo. O suposto “atentado à moral e bons costumes” (alegação do regime), constituía-se, na verdade, em rica e profunda reflexão acerca das relações matrimoniais, com seus possíveis desgastes, incompletudes e términos.

​A novela começaria onde todas as demais acabam: em casamento. A lei do divórcio sequer havia sido regulamentada, mas os personagens principais vivenciavam profundos dissabores conjugais. Crises, angústias, incertezas e até adoecimentos emocionais compunham um roteiro que, certamente, provocaria discussões ainda tabus naquele momento.

Nada a ver com banalização da instituição casamento, que perdura até hoje, para alegria de uns e infelicidade de outros. Eram três casais marcados por conflitos, já bem distantes da fase Romeu e Julieta. Eles procuram um psicanalista, a fim de enfrentar realisticamente os problemas de cada dia. Parecem movidos pela fidelidade ao amor, com o propósito de, supostamente, reconquistar o relacionamento.

O desfecho, claro, poderia se dar à base dos juntos para sempre, como um bom folhetim, ou não. Às vezes, o fim permeia tal enredo, entremeado por pensamentos e emoções que conduzem a um certo desapego: das alianças (estabelecidas explicita e implicitamente), da vida a dois, dos projetos comuns e até mesmo do lar, até então compartilhado.

​Cada pessoa vivenciará essa fase de forma única, com os seus desapegos, capacidade de racionalizar problemas, censuras e guilhotinas internas. Serão as suas despedidas, que, ado quase meio século da obra de Walter George Durst, acontecem cada vez mais frequentemente, sobretudo nos momentos pandêmicos.

​Na vida real, ainda bem, há quem vislumbre e até amadureça, términos de relacionamentos conjugais serena e civilizadamente, com direito à despedida de verdade, sem tantas beligerâncias e vinganças inúteis. Recentemente, fui sondada sobre algo dessa natureza.

Uma amiga descasou e resolveu que faria a “celebração do desapego”, onde ela e o ex-marido exerceriam genuíno perdão de eventuais erros cometidos, além de agradecer, na companhia de algumas pessoas, o tempo que deu certo. “Seria uma despedida de casado, bem ao nosso estilo, com amizade e gratidão”, afirmou, em tom emocionado.

​ A ideia chama a atenção para novos modelos de relações conjugais, com mais leveza, sabedoria e civilidade, inclusive no capítulo final. Sem culpas, amarras e ressentimentos, a travessia da finitude torna-se mais fácil. Sofrimentos sempre existirão, claro… Nenhum relacionamento acaba em meio a céus de brigadeiros, mas é possível um quase ou final feliz, além de respeitoso, mesmo quando tudo terminou e, como diz a canção, “nada mais restar do teu sonho encantador”.

 

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